“O maior amigo que eu cá tive na Benfeita”

Havia cá um doutor. Era o doutor Urbano. Andava a estudar, nessa altura. Formou-se em médico. Foi o maior amigo que eu cá tive na Benfeita. Era muito meu amigo. O meu marido ainda era primo dele. Ele gostava muito do meu marido, que o meu marido era muito bom homem. Chegou a dizer para mim:

- “Se tu casares com o António, eu baptizo-vos o primeiro filho que vocês tiverem. Mas se não casares com ele, escusas de cá vir ter comigo.”

E dizia para ele:

- “Se te casares com fulana, baptizo-vos o primeiro filho que vocês tiverem. Se não te casares com ela, escusas de cá vir ter comigo.”

Era muito meu amigo. A gente também trabalhava muito para ele. Fez muitos banquetes em casa dele. Formou-se uma sobrinha dele, doutora, também, médica. A formatura foi feita lá na casa do doutor Urbano. Tinha dinheiro. Ele é que fazia lá os banquetes. A mulher do irmão, que era a dona Clara, tinha uma menina. Chamavam-na Clarinha. O baptizado dela foi aqui feito na Benfeita, na igreja e o banquete foi feito em casa do doutor Urbano. Era tudo assim. A gente ia sempre àqueles banquetes todos. Eu, um dia, dei-lhe lá também um almoço e ele disse assim:

- “Olha, gostei do teu comer.” - disse-me ele para mim - “Gostei do teu comer.”

Gostou do almoço que eu lhe dei.

Ele estava no Eixo. Pertence a Aveiro. Um dia fui lá vê-lo com os sobrinhos dele, com a mulher e com a mãe. O Hermínio, o sobrinho, disse:

- “Ó prima dos Anjos, quer ir? Eu tenho o carro em rodagem. Vou ver o meu tio. Se você quiser ir, eu levo-a.”

Eu fui. Quando me lá viu, coitadinho, ficou todo contente. Diz ele assim:

- “Olha, comadre, não calculas a alegria que me deste em me cá vir ver.” - disse ele para mim.

Gosto de rezar o terço todos os dias. E ofereço por as minhas almas todas. Mas nunca deixo a alma do doutor Urbano por nomear, porque ele foi muito, muito meu amigo.