“Comer para todo o ano”

O dia da matança do porco era um dia festivo. Convidavam a família, fazíamos uma jantarada. Coziam o bucho. Ao outro dia, dos ossos, coziam aquelas ossadas do espinhaço e depois daquela calda faziam chouriças, chamamos nós o polme. Depois, convidavam a família mais próxima para comer, “espeliçar” aqueles ossos. O osso de espinhaço e outros ossos que tem o porco, cozem aquilo tudo, ou numa caldeira ou numa panela grande. Aquilo leva muita carne e “espeliçam”. Naquela calda põem-lhe farinha, temperam e fazem o que nós chamamos o polme, as farinheiras.

Havia umas poucas de festas no porco. Era a do bucho, era a dos ossos, era assim. Os presuntos e as pás eram para salgar. Punham numa salgadeira, bem salgadinho, para todo o ano. Quando precisavam iam ali. E do lombo e assim. Fazia-se num tacho ou numa coisa grande, como os torresmos. Depois enfiavam-nos numa panela, cobriam-nos com azeite. Quando queriam um bocadinho iam buscar à panela. Não havia como agora.

As chouriças a mesma coisa. Faziam as chouriças. Faziam umas de carne, outras de sangue. As chouriças de carne é só de carne, não leva sangue. São temperadas com sal e vinho. As de sangue são as morcelas. Levam sangue e os temperos, cebola, alho e essas coisas. Depois punham cada uma em sua panela, cobriam-nas com azeite. Era o governo para todo o ano. Era assim que se vivia naquele tempo. O porco dava comer para todo o ano. Mas agora não. Agora ninguém faz isso. Há aí dois ou três que fazem isso porque são os do talho. Esses ainda criam um porco para casa.