“A minha mãe passou muito”

A minha mãe passou muito para fazer o jantar para aqueles filhos todos. Era a sardinha partida em três bocados, um para cada, um bocado de broa e uma tigelinha de sopa. E então quando eu dizia assim:

- Ó mãe, eu queria a cabeça!

O outro dizia assim:

- “Hoje é para mim!”

Eu queria a cabeça porque comia mais broa com ela! Agora só se comem os lombinhos, já não se come mais nada. Numa altura, não comi a cabeça e bateu-me por eu ser má e estar a fazer desacatos com os meus irmãos. Era assim. Mas a gente não passava mal. Matávamos um porco por ano e tínhamos enchidos, carne e assim. E, às vezes, quando vinham pessoas para cavar a terra, que a minha mãe chamava porque tínhamos muita terra para cavar, para arranjar e semear, ela cozia bacalhau com grão. Aquilo era um cheirinho. E então eu era assim:

- Ai mãe, ai que cheirinho!

- “Ó filhinhos eles comendo, se sobrar vocês comem, se não sobrar...”

Era assim a vida que a gente tinha.