“O único que não se importava era o meu pai”

Comecei a namorar tinha 18 anos e pouco. O meu marido não foi nascido cá. Veio de São Tomé e foi criado no Monte Frio desde os 3 anitos. Foi o pai que o trouxe. Quando esteve fora, teve lá aquele rapaz. A madrasta teve duas filhas, mas parece que não se criaram, morreram. Ao fim, como não tinham filhos, ele procurou-lhe se ela queria que o trouxesse. Ela disse que sim, que trouxesse o menino. O pai trouxe-o e foi criado cá.

Quando o pai morreu, ele tinha 8 anos. Vê-se que a criação dele foi muito má. A mãe ficou viúva e ele, ainda muito novito, não ganhava nada. Viviam pobres. A mãe, coitadinha, passou muito mal na vida dela. O pai tinha-os deixado sem dinheiro e sem dinheiro estavam, porque tinham as despesas da mãe, dele e tudo. Tinham as fazendas, mas isso não lhes valia de nada, porque não havia quem comprasse. Ele, coitadinho, viu-se aflito com a vida. É a miséria. Até teve de pedir dinheiro emprestado para se casar. Depois, foi para Lisboa trabalhar de colchoeiro naquelas casas de móveis. Começou a ganhar alguma coisinha para fazer a vida dele. Ao fim, já lhe mandava umas coisinhas, uns miminhos. Até amêndoas lhe mandava! Ele foi sempre muito amiguinho da mãe.

Para começamos a namorar, como ele era de cor, nem toda a gente aprovava. Os meus irmãos não queriam! O único que não se importava era o meu pai. Ele conhecia-o, mas dizia:

- “Olha filha, ele bom rapazito parece ser. Tu fazes o que quiseres, mas estás sujeita a um dia os filhos virem de cor.”