“Não fui buscar o barro para enxertar as videiras!”

Eu quando fui de Monte Frio para Lisboa fui para casa dos meus padrinhos que me baptizaram. Eles é que me mandaram ir. A vida era má e eles estipularam que eu tinha de pagar 10 escudos. Ora se eu estava a ganhar 8 escudos como é que eu podia pagar 10? Antigamente diziam os rapazes, à noite, nas aldeias “Ah em Lisboa é que é bom!”. Pensam que chegam a Lisboa e estendem a mão à caridade e que cai o dinheiro, que não é preciso fazer mais nada e que se passa uma rica vida. Depois, no fim de lá estarem, coitaditos. A vida era má ou tinham que passar fome. Muitos iam para merceeiros. Dormiam até no chão. Comiam o que os merceeiros tinham. E o que faziam? Não estavam lá, vinham-se embora. Porque cá, mal ou bem, sempre tinham um presuntozito, um queijito e a sopita que os pais lhes faziam. Então o que é que diziam as pessoas desses rapazes que lá iam e voltavam?

- “Ah olha fulano tal foi para Lisboa mas já veio. Olha foi buscar o barro para enxertar as videiras.”

Então quando me acontece essa coisa de pagar 10 escudos e ganhar 8 eu fico assim:

- Não me diga que também tenho de levar o barro para enxertar as videiras!

Então fui ter com um senhor, o pai do Ramiro, que tem um stand de automóveis em Lisboa, em Entrecampos, contei-lhe a minha situação e fui teimando:

- “Ó pá é capaz de haver aí uma vaga, não sei... Vai falando.”