“Devo ao meu marido de estar aqui viva”

Fiz a Comunhão Solene, depois fiquei na costura. Até me casar fiquei na costura. A minha mãe foi modista e eu era costureira. Eu era assim serviço mais ligeiro. A minha mãe fazia vestidos de noiva e tailleurs e casacos compridos. Eu isso não faço. Saias e blusas e vestidos, eu faço. Agora a partir daí já é outro altar que já não me atrevo a isso. Depois casei-me.

Namorei, casei, fiquei cá na Benfeita. O meu marido é que foi para África. Fiquei em casa da minha mãe. Tive a minha filha. Nasceu também sem tempo, porque já era derivado também aos meus problemas. Continuei a estar na minha mãe, na costura e essas coisas todas e a cuidar da minha filha. Quando ela tinha ano e meio fui ter com o meu marido. Aí já foi pior. Aí já foi um tempo muito triste porque tive muitos problemas de saúde, sofri muito, ele sofreu muito, a minha filha sofreu muito. Passámos muita dificuldade derivado a mim, à minha doença. Os primeiros anos sofremos lá muito, depois pronto melhorou.

O meu marido aqui era carpinteiro. Ele quando casou passou para 1000 escudos por mês. Quando casou. Então tentámos ver se ele ganhava mais alguma coisa. As pessoas imigravam para África. Ele tinha lá pessoas cá da Benfeita conhecidas. A gente pediu e chamaram-no e ele foi a ver se ganhávamos mais. Fomos e eu fui lá ter com ele, mas depois tive muitos problemas de saúde, foi muito difícil.

Logo que cheguei lá tive uma trombose. Logo que lá cheguei. Era a minha filha pequenina, tive logo uma trombose. Eu melhorei. O meu marido primeiro esteve lá numa merceariazita, atendia ao balcão, mas depois chateou-se. Mais tarde pensámos em ele sair dali e ir trabalhar por conta própria. Então foi tomar conta de uma machamba de algodão. Fomos para outra territa também lá em Moçambique e comprámos uma casita. Uma casa velhota, mas pronto era nossa. E ele estava na machamba.

Lá em África estive sempre muito doente. Depois tive um aborto de seis meses, muitas complicações. Estive às portas da morte. Mesmo às portas da morte. Isso devo ao meu marido de estar aqui viva porque nem todos faziam o que ele fez. Naquela altura 35 contos era muito dinheiro e ele não quis saber do dinheiro, pediu emprestado e fretou-me um avião porque eu só podia vir de avião fretado para África. Para Lourenço Marques. Por causa do problema do coração. Quer dizer foi do problema do aborto de seis meses, mas que se desenrolou essas coisas todas depois do coração. Então as pessoas cá da Benfeita diziam que não fosse parvo que eu não chegava a de manhã, que não fosse parvo que ia ficar empenhado toda a vida. Ele disse:

-“Eu posso ficar empenhado toda a vida, mas faço tudo o que puder.”

E levou-me. Bendita a hora que ele me levou, porque realmente salvou-me. Se não me levasse não me salvava. Depois estive três meses em Lourenço Marques. Ele esteve lá um mês ao pé de mim e depois veio embora. Tínhamos a Elsa pequenina. Veio-se embora e eu estive mais dois meses lá. Depois fui para Portugal ser operada.