Outros tempos

Na matança punha-se o porco em cima de um banco e espetava-lhe a faca. Eram quatro pessoas. Três a segurar e uma a matar. A seguir desmanchavam. Estava de um dia para o outro e no outro dia salgavam-no, numa salgadeira. Punham a carne no sal para se conservar e depois iam tirando conforme iam comendo. Faziam chouriças. A chouriça põe-se em azeite, numa panela. E aí se conservavam.

Não havia dinheiro para comprar o trigo. Cozia-se a broa na minha casa. Lembro-me muito bem. Amassava-se, e depois cozia no forno. O milho era o moleiro que o moía. Fazia a farinha. Com uma pedra a rodar em cima de outra que desfazia o milho todo. Era um moinho movido a água.

O dia da cobra era no 1 de Maio. Nesse dia não se faz nada. Vem as cobras para casa, diziam. E havia a queima do gato. Eu nunca vi mas era pôr um gato dentro de um cântaro, e pôr fogo ao mastro e o cântaro cai e o gato foge.

A Torre da Paz foi construída com pedras de xisto, quando acabou a guerra. Todos os anos ela dá as 1620 badaladas. Ela está destinada a dar 1620 mas não dá todas porque não tem corda para isso. Está um bocado bom a tocar o sino. Essas badaladas são um símbolo de acabar a guerra.

No Carnaval tocavam o “zabumba”, chamavam ao bombo, e andavam por aí a correr as ruas. E havia um bailarico. E, às vezes, havia dois quando havia muita gente. Tudo acabou. A Páscoa passava-se com uma coisa qualquer também. Era a missa e depois vinha o padre trazer a cruz a casa. Depois o padre levava o folar. Era dinheiro. Géneros era pouco, era mais dinheiro. Um tanto num envelope e ele levava. O Natal passava-se despercebido. As famílias, às vezes, juntavam-se. A ceia de Natal era umas couves cozidas com o bacalhau e batatas. Faziam umas filhós. E a seguir iam juntar-se ao pé de uma fogueira. Mas eu por acaso até não ia.

A festa anual da Benfeita era a 15 de Agosto, pela Senhora da Assunção. Era música, bailaricos e comer e beber. Comia-se, às vezes uma carne fresca. Um cabrito. E doces também. Faziam o arroz-doce, às vezes uma tigelada. Outras vezes não. Naquele tempo era um atraso de vida.