“Ia toda de branquinho”

Tínhamos que combinar a parte do casamento. Os nossos pais também não estavam satisfeitos de a gente andar todos os dias na mesma vida. Casámos a 22 de Janeiro. Tinha 23 anos e o meu marido tinha 21, menos dois que eu. No dia do casamento, parece-me que até estava a chover. Foi feito lá em cima na casa dos meus pais, por cima do comércio.

O meu vestido foi feito por uma senhora cá da Benfeita, que era modista. A minha mãe comprou o pano. Comprou até em Coimbra na Sociedade de Fazendas, porque não vendia cá esses panos e, depois, mandou fazer. Eu escolhi o feitio. Tinha um decotezinho redondo, depois umas perolazinhas, todo bonito. Ia toda de branquinho. Era um vestido de cetim comprido até aos pés com manga comprida, um véu lindo, sapatinhos brancos e um raminho de flores. Era umas que há por aí muito compridas, a verdura verdinha e umas florzinhas brancas. Ia muito bonita. Era o que se usava. O meu pai podia bem. Na altura que fiz a Comunhão, é que ele já não se ralou, mas o casamento foi. O meu marido ia de azul, camisa branca, a gravata também em azulado muito levezinho e sapatos novos, pretos. Os pais dele também podiam. Eram padeiros cá da Benfeita. Só que não tenho uma fotografia do casamento. Nem havia fotógrafo!

Depois, pagou-se a meias o casamento. Aquele que tinha mais convidados pagava mais. O que tinha menos pagava menos. Agora, vão comer a esses restaurantes aí “pia baixo”, mas, antigamente, era sempre na casa da noiva que faziam a festa. Era tal e qual como se usava naquela altura. Na véspera, já se adiantava a vida. Assavam-se as carnes, as cabeças das reses, fazíamos batatas assadas no forno, arroz de fressura… Era conforme havia. Então, fazia-se ao almoço. Já comia toda a família. Havia sopa. Quem queria sopa, era sopa, quem queria canja, era canja. E, depois, eram os doces. À noute fazia-se, às vezes, arroz de fricassé de galinha. Uns comeres antigos e bons.

Chegou-se a noite, fomos para a cama. Fomos viver para o oiteiro, ali para o cimo do povo. Eu digo assim:

- Ai agora! Nem um beijo ele nunca me deu...