“Gostava de ver sempre as coisas direitas”

Mas o meu pai tinha muito crédito e era muito honrado. Ia para Coimbra e corria o comércio todo por meio tostão, naquela altura. Meio tostão ainda era muito dinheiro. Era para chegar aqui e vender. Não havia concorrência, mas havia muitas lojas. Em volta da casa da minha mãe, eram três lojas de comércio e todas pegadas umas às outras. Ele trazia sempre a mercadoria e comprava tudo a pronto pagamento. Comprava mais barato e depois podia cá vender mais barato. Também fazia o serviço por a mão dele. Não tinha nenhum ajudante para o ajudar, para pagar o que eles ganhavam.

Chegava cá sempre à quarta-feira junto ao escurecer. A gente só descansava bem segunda e terça, que era quando ele cá não estava. À quarta-feira, se ele visse um feijão-frade no chão ou um grão de milho ou uma coisa qualquer, pronto, começava logo a berrar com a gente. E não era brincadeira. Batia-nos. A gente se fizesse as coisas mal feitas:

- “Olha, vem-te o juízo. Senão, já sabes. Está ali o metro, apanhas com ele!”

Com o metro de medir a fazenda. Ah, foi assim. Mas, graças a Deus, vivemos sempre fartos de tudo.

Mais tarde, comprou um carrito. Os meus irmãos são cinco rapazes e duas raparigas. E eles todos tinham carta de condução. Mas o meu pai era rabugento. Gostava de ver sempre as coisas direitas. Então, os meus irmãos, às vezes, eram mauzitos e diziam assim:

- “Ou você se cala ou então ponho pela barreira abaixo!”

A rirem-se com ele.