“Trabalhavam na agricultura os dois”

Os meus pais também eram daqui. A minha mãe era da Deflores. O meu pai era da Benfeita. Como se conheceram, isso não sei, mas, então, era aqui tão próximo. À minha mãe, morreu-lhe a mãe tinha ela uns 7 ou 8 anos e depois morreu-lhe o pai aos 12 anos. Então, ela veio para a Benfeita ser criada com as avós. E, depois, aqui é que se conheceram, com certeza. Trabalhavam na agricultura os dois.

O meu pai ainda andou muito tempo em resineiro nos pinheiros. É que em primeiro andavam na resina. Sangravam os pinheiros e depois tinham os “panelos” a aparar a resina. Andavam eles com uma lata assim grande ao ombro a tirá-la. Apanhavam-na para aquelas latas e iam-na levar em cima, à estrada, para algum sítio onde pudesse ir o carro de bois puxar e carregar aqueles barris. Mas os resineiros, era tudo a pé! Galgavam estes montes todos. Oh, mas o que é que se ganhava? O empreiteiro, esse, é que poderia ganhar, que mandava a resina daqui para fora. Aqueles barris grandes de resina iam para as fábricas aí “pia baixo”, não sei para donde. Agora eles, coitados, ganhavam 20, 22 escudos. Oh! Mas 20 escudos dava mais que hoje dá 5 euros! Eu vinha para a loja do tio Péssimo, às vezes, com 100 escudos. Levava bacalhau, levava o que eu precisava e ainda levava muito troco. Agora é que a gente vai, não traz nada.

Depois, também foi para Lisboa. Andou muitos anos ainda em vendedor da rua. Foi de novo e lá se habituou. Andava a vender fruta e o que calhava. Tinha lá também tios e uns irmãos. Andavam na venda do leite e outro era polícia. E ele para lá foi e lá andou na rua a vender fruta e o que calhava naquele ano da fome, que foi em 1945, quando foi a Segunda Guerra. Foi quando nasceu uma irmã minha. E logo no ano a seguir nasceu a outra. Ele, coitadito, lá andava e nunca tivéramos cá falta de nada. Todos os meses vinha um cabaz de Lisboa nas camionetas. Tínhamos cá sempre muito comerzinho.

Depois, arranjou um patrão e esteve no Porto. Tinha um lugar na praça do Bolhão. Do Porto, veio para Aveiro. Tinha lá um armazém de bananas e de fruta. E eu aos 15 anos, também fui para Aveiro. Estive lá dois anos e meio. De Aveiro, o meu pai veio para Coimbra. Tudo sempre por conta do mesmo patrão. Estive lá outros dois anos e meio. Em Coimbra, tinha só um armazém de bananas. A minha mãe é que vinha para a praça até ao meio-dia. Tinham também um lugar na praça, mas tudo por conta do patrão.

Andei daqui para fora cinco anos. A vida lá era muito diferente. Oh! Pois era. Ele nunca devia ter saído de lá para fora, mas pronto. Depois, vim, porque a perdição do meu pai era a Benfeita, as quintas.