“Para a cortiça ou para o peixe”

Os homens iam para Lisboa, porque se ganhava dinheiro! Iam para a cortiça ou para o peixe. Fui a Lisboa fazer 15 anos e depois passei em vários sítios. Quando para lá fui, fui trabalhar para uma mercearia. De uma mercearia fui para uma drogaria. De uma drogaria fui para uma carvoaria. De uma carvoaria fui para uma casa de vinhos e comidas e depois vim para a Empresa Geral de Transportes, em Braço de Prata. E da Empresa Geral de Transportes fui para o tráfego do Porto de Lisboa. Do Porto de Lisboa ainda vim passar para a Secil, do Poço do Bispo. E da Secil, do Poço do Bispo, tornei para o tráfego, onde fiquei até me reformar. Andei lá 30 e tal anos, não chegou aos 40. Quando me vim embora, o pessoal era demais e então o sindicato em conjunto com os patrões queriam mandar algumas pessoas embora. Eles resolveram a situação daqueles que tinham 55 anos feitos ou que ainda não tivessem chegado. Depois, todo aquele que tivesse de 45 anos para cima tinha que se vir embora. Na altura que fui reformado, o Governo exigia que tivessem 36 anos de Caixa. E o Governo e os patrões davam 10 anos de desconto para as pessoas se virem embora. Mas eu não precisei deles porque já tinha 37 anos de descontos. De vez em quando, vinha a Soito da Ruiva fazer a sementeira. A minha mãe é que tomava conta de tudo, pois o meu pai já tinha morrido. Enquanto estive em Lisboa, a minha mulher esteve cá sempre. Quando fui para lá, ainda nem namorava com ela. Mas havia mais pessoas do Soito da Ruiva a trabalhar em Lisboa. Todos os homens queriam para lá ir! Na altura em que fui, o Manuel Grácio também andou com outras pessoas daqui. Mas ele sempre trabalhou no peixe. Alguns dos que trabalhavam no peixe foram trabalhar comigo também, mas ele não teve direito a entrar, porque a Caixa era a mesma mas os descontos não eram iguais.