João Brandão - “Muito ouro, prata e mel”

Recordo-me de ouvir falar do João Brandão. Ele não era daqui. Nem sei se ele era de Vila Pouca ou de Midões. Era de lá de baixo. Mas era muito mau! Matou um afilhado dele! Uma vez chegou ao Porto da Balsa, eu não me lembra dele mas era o que contavam a minha mãe e a minha avó. Havia lá umas casas que eram de pessoas ricas. Tinham muito ouro, prata e mel, muita coisa. Ele chegou lá e já andava a ver se ia lá matar os donos. Eles fugiram todos de lá para um sítio que chamam a Rocha. Mas ficou uma pessoa em casa. E eles chegaram lá e começaram a falar, ao fim a pessoa que ficou em casa disse: - “Os senhores agora comiam uma saladinha?” - “Ai, essa agora, convinha.” Iam com o calor. E ela agarrou, fez ver que ia para o quintal e lá fugiu por trás e foi ter onde os outros estavam. E eles esperaram, esperaram, ela não apareceu, deram-lhe caça. Os outros estavam longe mas viam e disseram: - “Olha! Lá chegou o lume aos potes do mel!” Era aquele fumo negro. Depois diziam: - “Olha! Lá chegou agora à prata! Agora ao ouro!” Que o ouro e a prata chegaram ao rio, como ele queimou aquilo derreteu-se e foi até ao rio. Tinham lá muito! Ele era mau, mas à minha bisavó ainda lhe valeu uma vez. A minha bisavó, também sabe Deus como se ela viu. E o meu bisavô também se juntou a esse João Brandão. E ela, coitada! A minha avó foi para o cimo do Piódão, chamavam-lhe as Catraias de São Pedro, que é no cimo da serra. Tinha uma barracazinha e levavam-lhe para lá o vinho aos garrafões. Também era só o que para lá levavam. Mas passavam lá nesse tempo, diziam, os almocreves, que eram os que andavam com os machos. E eles mandaram vir comer, vinho e a palha para os animais e, ao fim, não queriam pagar. A minha bisavó estava a chorar e o João Brandão estava lá, que ele tinha lá um quarto por conta dele. E disse-lhe assim: - “Ó tia Rosa, que é que você quer? Que é que você tem?” - “Que é que eu hei-de ter? Os almocreves comeram e beberam e botaram o pasto aos machos e agora não me querem pagar.” Ele disse-lhe assim para ela: - “Você conhece-o?” - “Conheço.” - “Então ande lá diante dele.” Chegou ao pé dele: - “Qual é o que aí está que comeu e bebeu e não quer pagar? Dê lá já o dinheiro à mulher! E não a quero maltratada, que ela é mulher de um amigo meu!” Deu-lhe o dinheiro e no outro dia já por lá não passou, que mandou os machos pelos outros e ele já deu a volta pelo meio do mato com medo de lá passar. O João Brandão era medonho! Toda a gente tinha medo dele. Julgo que já morreu.