“Em Agosto dia sim, dia não ia regar as cerejeiras”

Já estou na terra há bastante tempo. Sou reformado, não faço nada. Voltei cá porque eu aqui estava melhor. As médicas até me mandavam, porque os ares aqui são diferentes e tudo. Eu estava muito bem aqui. Em Lisboa estava sempre... Se estou doente lá ainda andava mais doente. Porque há mais confusões, por tudo. Vim para o pé da minha mãe. A minha mãe já morreu. Agora estou cá sozinho. Não tenho lá casa. Tenho lá o meu irmão, mas tem a casa dele, não é minha. Estou aqui, estou bem. Aqui gosto de tudo. Já o meu irmão gosta muito daqui. Estive cá até aos 20 anos. Depois estive uma época em Lisboa. Aqui também já há bastante tempo que cá estou. Nunca estava bem em Lisboa. Nunca gostei muito de Lisboa nem de cidade nenhuma. Para viver é na província. Águas melhores, sossego. Só o sossego... A gente chega, por exemplo, às dez horas ou 11 horas da noite para ir dormir, é verdade. Já me tenho levantado à meia-noite e sento-me na escadaria lá para baixo. Aquilo é que é uma maravilha. Está tudo sossegadinho. Está-se ali horas esquecidas, é uma maravilha. Na cidade, se não é um é outro. Vai um carro a passar, faz um barulho. Um de mota a passar, faz um barulho. É mais confusão, mais tudo. Anda tudo mais em confusões. Para mim, para esta doença que eu tenho, não gosto muito de confusões nem de barulhos.

O meu dia às vezes... É tratar das cerejeiras e figueiras. Trato delas e rego-as. Às vezes quando era em Agosto dia sim, dia não ia regar as cerejeiras e regava também as do meu vizinho. Os outros tempos era a ouvir música, a rezar. Sou católico e rezo muito. E é a andar de trás para a frente. Vou até lá em cima ao cruzamento ao Piódão velho.