“Eu ia para as cabras e ouvia sempre a bola”

Brinquedos não tínhamos. Já havia um carrito, mas isso... Os pais, às vezes, nem compravam brinquedos. Por brinquedos davam rebuçados que era a melhor coisa. Naquela altura já havia rebuçados. A gente ia à tasca e comprava um bocado de rebuçados. Chupava os rebuçados que era melhor que andar a brincar com carros.

Às vezes, a gente punha-se a brincar às escondidas. Ficava um a contar, “dois, três” e os outros fugiam. O que ficava a contar tinha que descobrir onde estava o que se foi embora esconder. Andávamos assim pelo caminho abaixo a fazer aquilo. E havia mais brincadeiras.Também já se jogava à bola. Bolas é que já havia naquela altura, mas a gente não tinha. Já era assim uma bola grande de jogadores de futebol e essas coisas. Aquilo era um rapaz que levava lá para a escola para a gente jogar. Antigamente, se uma pessoa precisasse de uma coisa da outra, ela emprestava logo.

Nós lá éramos o Sporting, o craque. Lá na escola era o Sporting contra o Vitória de Setúbal. A gente jogava, mas tínhamos que ganhar sempre. Éramos pequeninos, mas já tínhamos aquela noção que não se podia perder. Ninguém gosta de perder, “nem que seja a feijões”.

Já havia rádio. Eu ia para as cabras e ouvia sempre a bola. Já era doido naquela altura por futebol. Não admira gostar muito de futebol que eu já era doido por futebol. Naquele tempo parece que o rádio ainda dava mais alto. Havia menos rádios, trabalhavam numa frequência grande. Até gostava... Quando era golo a gente punha aquilo mais alto que era para toda a gente ouvir que estávamos a ouvir o futebol.