“Cá não se governavam sem dinheiro”

Noutro tempo, vivia-se muito mais mal que agora. Agora vai-se indo, vive-se melhor, mas antes era diferente, não havia dinheiro. Então, as pessoas começaram a sair da terra para ganharem. Cá não se governavam sem dinheiro, iam para a França. Diz o meu irmão que o trabalho lá é melhor e traz umas boas reformas.

Mas, já antes, os meus irmãos andavam nas Minas da Panasqueira e eu é que fui para o Alentejo trabalhar. De solteira, tinha 16 anos, fui para o Alentejo. Tinha que ganhar dinheiro, que cá não havia onde se ganhasse. Mas não ia sozinha. Iam homens e mulheres. Era mais mulheres que rapazes. Como a gente conhecesse ia só com as de Chãs d'Égua, do Piódão, das Casas Figueiras, uma territa que está aqui por baixo, do Sobral Casegas, por trás da serra... Íamos muita gente daqui.

Custou-me separar dos meus pais. Então não custou? Ei! Eu, assim como os meus irmãos, nunca fiz vida senão estar sempre com eles. Os meus pais ainda escreviam para lá, mas tiveram que aguentar. No fim de cinco anos, já não quis para lá voltar mais. Ah! Poça mais a terra que o Diabo cavou! Lá nunca vi neve, mas chovia muito. Não! Não quis voltar, porque estava demais. Os meus irmãos mais velhos casaram-se e eu tive que rumar à fazenda com os meus pais.

É assim a vida. A vida no outro tempo foi muito ruim, muito ruim. Hoje não, é melhor de viver. Agora, eu é que era mulher de ir para o Alentejo trabalhar? Antes queria morrer.