Comer e vestir noutros tempos

Noutro tempo, a nossa alimentação era tudo das nossas terras. Era o milho, a batata, feijão, ervilhas, favas... Assim foi nosso passado.

Quem tinha cabras e ovelhas fazia queijo. A gente ia ordenhar o gado. Depois ia buscar o pano e púnhamo-lo na boca da panela. Púnhamos-lhe um bocadinho de pó ou cardo. Estando bom, coalhado, fazia-se o queijo. Botava o queijo para o prato e, com o acincho, saía o soro todo por os buracos. O soro botava-se fora para o cão ou para quem o quisesse comer. Depois, punham o queijo a secar numa palheira, com o ressoar, para se porem amarelinhos. Dia sim, dia não, tinham que ser lavados. Duravam algum tempo mas, quando era muita gente, comiam-no bem de uma vez.

Também faziam pão. Ainda tenho um forno a lenha acima. Anda o meu genro com o lume no forno para fazermos bolas para o almoço. Antigamente, cada um tinha o seu. Quando havia milho, faziam a farinha. A gente secava o milho, ia ao moinho. Em Chãs d'Égua, também há. Quando estava solteira, tínhamos aqui em baixo. Eu tinha um mesmo só meu. Mas, se nos viessem pedir, a gente emprestava, dava para lá irem moer. Tenho um ali em baixo que também é nosso. Mas diz que não lhe dá água, não deita. Quando veio umas enxurradas há dois anos, a água levou tudo. Levou as levadas, levou os moinhos. Partiram-nos. Há alguns três ou quatro anos que deixaram de moer. É assim. Agora também já não há quem queira cultivar. Compra-se a farinha quando é preciso. E, como vem o padeiro, compramos pão do padeiro.

No Natal já se comia carne de cabra, borrego ou chibitos. Agora, eu não tenho cá nada assim de chibos, mas não me falta a carne na arca. Tenho uma arca cheia. Também se fazia bolos, filhós, pudins, tigelada... Essa é boa de fazer. É ovos, leite e açúcar. Tudo misturado e depois vai-se pôr no forno ou no fogão. Eu fazia, mas agora já não tenho paciência.

Antigamente, iam aí por as feiras comprar o pano e fazia-se a roupa em casa. A minha mãe dava-a a fazer a uma tia. Agora, faço por mim, que eu tenho máquina. Até tenho duas: é uma ligada à luz e outra não é ligada à luz. Mas, como tenho as cataratas e as diabetes, já não sou capaz de enfiar bem as agulhas. Para lavar a roupa, lavávamo-la no ribeiro com o alguidar, sabão e lixívia. Lá em cima, em Chãs d’Égua, não havia lavadouros, mas em Foz d’Égua já há. E eu, antes de comprar a minha máquina, lavei muita vez ali.

Íamos ao sapateiro fazer o calçado. Era de muita qualidade. Mas eu, para mim, não posso usar calçado alto. É tudo salto baixo.