“Cheguei a matar aos dois”

Também havia a matança do porco. Então, eu cheguei a matar aos dois! Eu não. Matava o meu marido ou o filho, qualquer um. O meu marido matou muita vez e, outra vez, era o meu rapaz. Aos 8 anos, já matava porcos. Ali no mês do Natal faziam a matança. Juntavam-se as famílias umas com as outras. Hoje era para mim, amanhã era para este, outro dia era para aquele e ajudavam todos uns aos outros. Tinham carquejas para o chamuscar e, ao fim, navalhas para tirarem o pêlo todo. Os homens eram os que chamuscavam. As mulheres faziam o comer e iam lavar as chouriças.

É bom de fazer as chouriças. A gente lava-as bem lavadinhas numa gamela ou num alguidar, todos os dias, duas vezes ao dia. São viradas e levam sabão e sal para aquelas rameiras sair tudo. Ainda demoravam um pedaço bom, conforme elas estivessem. Enfiam depois uma panela com dentes de alhos para sair o cheiro. Depois, a gente miga a carne. Todos os dias se vai lá mexer carne e malha-se as chouriças duas ou três vezes ao dia. Ao fim, está a carne bem curtidinha, enchem-se nas chouriças, nas tripas do porco. Fazem-se da carne que o porco tem. A gente lava-as bem lavadinhas, viram-se bem viradinhas e depois é que se enche.

Depois de prontas, punham-se a secar no fumeiro. A gente acendia o lume na cozinha. Punha a gente as chouriças numas varas e estava a fogueira por baixo a dar calor. Para ficar bom, é conforme o lume que elas levassem. Estas que era de sangue fazia-se agora, encalava-se, podiam-nas tirar, arrecadar. A carne é que era mais custosa, demorava mais tempo. Às vezes, oito dias, 15 dias. O resto da carne ia para uma salmoira, salgavam-na com sal. Não é como agora, que temos as arcas. Punham na salmoira tapadinha com sal, por causa de não se estragar. Podia durar três e quatro meses. Era conforme. Nem todos os dias se comia carne.