“Diziam que havia lobisomens”

Uma ocasião, havia aqui um homem que foi comprar um macho lá longe detrás da serra. Depois, trouxe-o e meteu-o na loja. Ao outro dia, nós sentíamos de noite, pumba, pumba. Era o macho a escavacar a porta com as ferraduras. Nessa altura, eu estava aqui com o meu tio. Ainda era vivo. Disse-lhe assim:

- Ó, tio, o macho que foi comprar a fulano... Está a porta escavada - eu levantei-me cedo -, o macho já lá não está.

Diz ele assim:

- “Está, está! Então ele deixava agora o macho...”

- Ai, o colar está, o macho não!

O meu tio falou-lhe, que ele estava aqui em baixo:

- “Ó, Felisberto!” - ele era Felisberto.

Saiu de casa:

- “Que é que você quer?”

-“Olha que já lá não tens o macho. Ou to roubaram ou ele fugiu.”

O macho passou nos Chãs d'Égua, de noute. Os dos Chãs d'Égua, tudo a tremer... Diziam que havia lobisomens. Antigamente, havia! Sentiram o macho a passar na rua. As ferraduras que até botavam uma “fachuqueira” de lume. Toda a gente “ensabucou” e se tapava debaixo das mantas com o medo dos lobisomens a bater nas portas. E foi o macho que lá passou. Foi para o mesmo sítio donde o comprou.

Os lobisomens eram pessoas que andavam por aí de noite. Passavam aí por essas serras. Eram aos dez e aos 11 tudo a cavalo. Quando se criou a minha mãe, em chegando ali por volta das cinco horas, no Piódão ninguém podia sair à rua. Andavam aquelas pessoas a cavalo, com aqueles cavalões grandes! Chamavam aquilo lobisomens. Se apanhassem alguém na rua, faziam-lhe mal, eram capazes de os matar, com umas farpas que traziam ao ombro. Tinham farpas espetadas em paus. A minha mãe dizia assim:

- “Ai, filhos! Agora é uma vida, mas quando a gente se criou nem se podia sair. Em chegando as cinco horas a gente tinha de recolher todos para as casas, que das cinco da tarde às seis da manhã, ninguém podia sair à rua.”