“Que remédio tínhamos...”

Éramos oito irmãos. Era uma família grande. Um pão era partido numa mesa e era uma fatia para cada um. Pão de milho, do que a gente cultivava. Dávamo-nos todos bem. Que remédio tínhamos nós senão darmo-nos bem. Brincávamos uns com os outros, na paródia, a jogar à chona. Era uma cova na terra. Daí, arranjávamos uma bola redonda e uns paus, para ver qual era o que a metia mais vezes no buraco. Ganhava aquele que metia mais. Jogávamos às cartas também. Quando éramos mais novos, jogávamos à cozinha.

À noite, rezava-se o terço, ou antes ou ao fim de comer. Não nos deixavam ir para a cama sem a gente rezar. O meu pai passava o terço e todos rezávamos. Aquele que não quisesse, pumba! Levava logo com uma ripeirada na cabeça. Já sabia que apanhava. E castigavam-nos.

- “Não rezas, amanhã vais ser castigado!”

Ao outro dia, éramos castigados. Ou não nos davam de comer ou mandavam-nos ir fazer outro serviço que a gente, às vezes, até nem podia. Mas tínhamos que ir, senão, meu amigo, levávamos porrada. Eu também fui castigado. Ui, tanta vez!

A vida, como é que era... Às vezes, dizem assim:

- “Ai, a vida de agora é uma vida boa.”

É, é, mas a vida quando a gente se criou, era o dobro. Era ruim. Queria a gente às vezes comer e que é dele? Onde é que ele aparecia? Donde é que ele vinha? Era preciso sonharmos.