“Tinha os meus vestidinhos de levar à missa”

Andei na catequese no Piódão. Tenho boas recordações. Gostava muito de ir. Fiz a Primeira Comunhão e fiz a Profissão de Fé. Fiz tudo isso e gostava. Acho que um dos que me preparou é o nosso padre agora. É o padre António. Ainda não era padre, na altura. O outro também não era e não chegou a ser. Andavam no seminário, mas davam-nos a catequese. Aprendíamos várias coisas. Umas sei, outras já não sei. Ensinavam-nos - chamava-se - a doutrina. Agora dizemos que vamos à catequese. Ensinavam-nos o Pai Nosso, a Ave Maria. Normalmente, quando a gente ia, já sabia essas coisas. A minha menina, a neta, hoje não vai à catequese e já diz. E quando não diz direito:

- “Avó! Diz tu!”

Ela gosta e pede-me para se benzer e não sei quê. Quando fui para a catequese, também já sabia essas coisas.

Ao domingo, íamos à missa. Era uma festa! A gente cá não tinha nada e o domingo era o dia diferente. Não se trabalhava. A gente preparava-se melhor, vestia as roupinhas melhores. Hoje, a roupa é sempre igual. Naquela altura, eu tinha os meus vestidinhos e os meus sapatos de levar à missa. As outras crianças também.

As pessoas ligavam muito à missa. Não quer dizer que agora não liguem, mas é diferente. Naquela altura, as pessoas, antes de morrer, costumavam confessar-se e receber os últimos sacramentos, como se chamava cá. Ninguém cá da freguesia morria sem receber isso. Ia o senhor padre - não me lembro qual era - dar a Sagrada Comunhão. Rezavam as orações, que eu agora não sei dizer o nome, às pessoas ainda vivas. No hospital, cheguei a pedir isso para a minha mãe. Quando estava em Coimbra, vi que ela estava muito doentinha e perguntei se era possível o senhor padre ir à enfermaria onde ela estava. Disseram-me que sim, mas tinha de pedir por escrito. Eu pedi. A enfermeira, depois, confirmou-me que foi verdade:

- “Olhe, ó dona Maria dos Anjos, fique sossegada que o senhor padre veio cá e já deu os últimos sacramentos à sua mãezinha. Está tudo em dia.”

Eu até achei graça ao que ela disse. Aqui não morria ninguém sem fazer isso. Hoje, não sei. Só há uns tempinhos é que estou cá, por isso não sei se ainda fazem isso. Na altura que eu era miúda, lembro-me que faziam.