“Só fiz a quarta classe”

Quando entrei para a escola, tinha 7 ou 8 anos, possivelmente. Se nasci em 1945, seria 1952. Naquela altura, não se entrava antes dos 7. Como eu faço anos em Fevereiro, se calhar já não deu para entrar esse ano. Não me lembro se entrei com 7, se foi já com 8 anos.

Eu ia para a escola a pé do Torno para o Piódão. Era longe. Agora, já nem lá há escola, que o fogo queimou aquilo e nunca mais arranjaram. As pessoas ainda iam longe. A caminhada, logo de manhã, ajudava-nos e tudo era bom. Era assim.

Na escola, ensinavam-nos o Português, que a gente chamava o Ditado. Era para não darmos erros. Para fazer as letras bem feitas, era naqueles caderninhos de duas linhas. Era a caligrafia. Eu gostava muito de fazer isso. Escrevia bem. Agora, escrevo mal, porque não uso tanto assim. Na altura, escrevia bem, porque nos obrigavam a ter uma caligrafia bonita. A matéria que mais gostava era da Redacção. Gostava muito, porque a gente respondia o que queria. Também gostava de ler. Depois, a Matemática era as Contas, os Problemas. Não sei se ainda hoje é esse o nome que se dá. Eram problemas à base de Matemática. E era Desenho, que eu gostava muito de fazer. De Matemática é que não gostava nada. Eram as minhas amigas que me faziam a conta ou os problemas. Depois davam-me sem ninguém se aperceber. Hoje, os alunos também fazem assim, mas no meu tempo também já se fazia. A professora chamava-nos ao quadro. Eu gostava muito de ir ao quadro. Se ela me chamasse sempre a mim, eu não me importava, porque gostava. Se tivesse alguma dúvida, ela ensinava-me. Quando a gente estava sentada, nem sempre conseguia. Via o que os outros faziam e tentava fazer, umas vezes bem outras vezes mal.

Tinha uma relação boa com os meus colegas. Eu era assim um pouquito tímida, porque não estava habituada. Tínhamos lá um primo que já era mais velho. A escola era junta. Eu estava na primeira classe e ele estava na quarta. Tinha uma irmã, uma prima minha, que é da minha idade. Havia, de um lado, o recreio para as raparigas e, do outro lado, para os rapazes. Então, no recreio, nós passávamo-nos para o lado do meu primo, para ir brincar e estar ao pé dele, que ele nos guardava. Sentava-se e nós sentávamo-nos, uma de um lado, outra de outro. Isto no primeiro ano, porque depois já aquilo era nosso. No princípio, era tímida. Era engraçado. Por acaso, era mesmo.

Depois vinha para casa. Antes de chegar, via a minha porta. Antigamente, não se fechavam, estavam sempre abertas. Se eu via a minha porta aberta, ficava tão contente, tão contente! Era sinal de que a minha mãe estava em casa. Se a porta estava fechada, era sinal de que não estava. Eu ficava tão triste, tão triste... Chegava a casa, não via nada. Ia logo ao encontro onde ela estivesse. Era um hábito. Mas estava sempre alguém à minha espera. Se não estava a minha mãe, estava a minha avó ou isso, mas eu, naquela hora que chegava, queria era a minha mãe.

Ela incentivava-me a estudar. Eu é que não gostava muito. Sou sincera. Fazia, porque tinha que fazer, mas não gostava. Só fiz a quarta classe.

Fiz o exame em Arganil. Não era aqui na terra. Os professores preparavam-nos para todas as matérias. Agora é exame de Matemática e de Português. Na altura, a professora preparava-nos de tudo. Se achava que estávamos preparados, íamos a exame. Se não estávamos preparados, ficávamos para outro ano. Eram mais bem preparados que agora, creio eu. Agora, acho que é mais fácil. Não sei se é o termo, mas não exigem tanta coisa como exigiam na minha altura.

Se eu gostasse de estudar, a minha mãe faria o sacrifício para eu ir para outro lado. Cá não havia. Eu é que não quis. Não estava habituada a estar sozinha, nem gostava de ir para fora. Se fosse hoje, se calhar já ia. Mas na altura, não. Havia moças cá que iam. Aqui da terra, acho que não mas, de outras terrinhas que eu conheça, iam estudar para fora. Eu não tinha muita força de vontade e a minha mãe não me obrigou. Tudo tem de ser de vontade. O que é obrigado não presta. Deixei a escola e fiquei a ajudá-la nas tarefas da casa.