“Estive lá sete anos e meio em Moçambique”

Então depois fui para África com 22 anos. Quando me casei tinha uma pessoa amiga em Lisboa que me marcou a viagem de avião para ir. No dia em que eu me casei ainda não sabia qual era o dia em que ia. Passados dois dias recebi o bilhete de avião para ir oito dias depois. Eu casei-me a um domingo e ao outro domingo a seguir fui logo para África. Eu casei-me a 27 de Janeiro que foi no dia em que o meu marido fez anos. Embarquei devia ter sido dia 4 ou dia 5 de Fevereiro, porque foram oito dias. Um irmão meu e uma cunhada levaram-me a Lisboa ao aeroporto. Apanhei o avião, fiz paragem em Luanda onde tinha pessoas da minha terra amigas à minha espera. Estive umas tantas horas no aeroporto. Depois segui para a Beira.

Na Beira houve outra paragem, tinha pessoas amigas à minha espera. Tinha que se dormir uma noite na Beira e eu fui dormir, que já estava tudo combinado, em casa de pessoas conhecidas da minha terra. Eles estavam à minha espera para me levarem do aeroporto e depois ao outro dia irem-me tornar a levar ao aeroporto para eu seguir viagem para Nampula. À noite elas quiseram ir mostrar-me um bocadinho da cidade da Beira, então fomos dar uma volta à noite de carro. Acontece que no caminho tivemos um acidente. Fomos parar a uma clínica. Sei que gritei muito, gritei muito. Depois eles ligaram para os familiares. Foram lá ter connosco. Eu tinha que apanhar o avião ao outro dia para Nampula. Saí da clínica era meia-noite e tal. Nesse dia saí bem sem nada, ao outro dia já tinha as minhas pernas e os meus braços todos negros. Eu ia no banco de trás do carro e com o embate eu fui bater nos bancos da frente. Ao outro dia levaram-me ao aeroporto, mas ainda se notavam um pouco as negras.

Depois da Beira a próxima paragem foi em Nampula. Já estava o meu marido à minha espera. Ele conhecia-me e eu conhecia-o, mas por causa da confusão eu disse o que levava vestido, para ele não se ir agarrar a outra. Tinha o meu marido e um cunhado meu à minha espera e mais um casal de Arganil que eram familiares. Ainda hoje são vivos, familiares da senhora com quem eu aprendi costura. Engraçado que levei uma encomenda pequenina, dessa senhora, para esses senhores que estavam em Nampula à minha espera. Eu já os conhecia. Todas essas pessoas que estavam lá eram pessoas de Arganil que umas já lá estavam há uns dez anos, outras há uns dois anos mais ou menos. Houve uma filha da senhora com quem eu aprendi costura que foi uns dois meses antes de mim e também estava à minha espera porque a terra era pequena, conhecia-se:

- “Ah, está na Beira então a minha filha vai esperar.”

Levei no meu saco coisinhas que mandaram. Levei para a Beira e levei para Nampula. Um foi um fio, outro foi uma coisa para uma pessoa de família, um neto.

Então fiquei quatro dias em Nampula em viagens de núpcias. Depois de Nampula é que regressámos ao Chiúre que era onde o meu marido estava a viver. Ele era comerciante e tinha machambas. E lá sociedade com um irmão. Estive lá sete anos e meio em Moçambique onde trabalhava todo o dia na loja. Tínhamos empregados, tínhamos criados em casa.

Ao fim de sete anos e meio nós tínhamos a viagem marcada para vir de férias. Eu, o meu marido e a minha filha. Vínhamos em Julho. Deu-se o 25 de Abril. Como tínhamos as férias marcadas e as viagens já pagas, viemos à mesma de férias. Viemos de férias por dois meses. Entretanto as coisas começaram-se a complicar e o meu marido foi e eu fiquei com a minha filha. Fiquei em Arganil em casa dos meus pais e ele esteve lá desde Setembro até Dezembro. Acho que já cá passou o Natal. Esteve lá esses meses sozinho. Porque nós tínhamos lá muita coisa. Ele foi e eu fiquei. Depois ele tratou das coisas e veio ter a Portugal. Ele era daqui, eu era de Arganil. Eu gostava muito de ter ficado na minha terra. Tinha lá os meus pais, tinha lá a minha família toda. Tinha estado sete anos e meio sem estar ao pé da minha família e eu preferia que o meu marido tivesse arranjado qualquer trabalho, qualquer emprego ou estabelecesse em Arganil. Ele não quis. Quis vir para aqui.

Custou-me um bocadinho porque eu tinha ido para África, nunca tinha saído de Arganil. Tinha vindo cá uma vez para ir ver a Fraga da Pena, mas nem demos com o caminho. Voltámos para trás e não vimos nada. Fui a um lado e fui a outro, mas fiz a minha vida toda em Arganil. Fui para África, voltei uns meses para Arganil e depois é que vim para a Benfeita. Custou-me porque vim para outro ambiente, vim para outro meio, mas com o tempo fui-me habituando.