“Era um dia de festa”

A matança do porco era mais ou menos pelo Natal. Para quem matava os porcos, a melhor altura era essa para secar o enchido. E no Verão não dava por causa da mosca, que podia pousar na carne.

Era um dia de festa. A gente juntava-se, tinha de ser mais gente para segurar o porco. Matava-os, e os homens chamuscavam-nos com umas carquejas. Raspavam tudo bem raspadinho, lavavam-nos e penduravam-nos. E daí abriam-nos, para tirar as tripas. Cozia-se o sangue num caldeiro grande. Ao fim de estar cozido já começavam a comer o sangue. Comiam e bebiam. E no fim de tirar as tripas, a gente ia-as extremar. A gente extremava as tripas, tirava o entretinho da tripa. É como matar uma galinha, tem a tripa, a gente tira devagarinho com as mãos, começa numa pontinha, a eito, a eito, a eito e tira-se tudo. Separa-se uma coisa da outra. E é isso. A gente ia lavar as tripas e dali é que a gente fazia o enchido. E ainda hoje o é. No fim é a carne. Quem quiser miga a carne bem miudinha e tempera. Depois deixa estar uns dois dias no molho, faz-se os temperos, estando em modo para encher as chouriças põem-se a secar ao fumo. Ali é que se faz o enchido. O resto da carne ficava em sal numa arca. Chamávamos a salmoira. Púnhamos ali a arca com bastante sal, bem salgadinha, ali é que se aguentava. A gente quando queria ia lá buscar. Os lombos podiamos cortar aos bocadinhos e púnhamos-lhe sal e os temperos. Fritávamos, púnhamos numa panelinha com azeite para conservar. A gente queria por uns dias, ia lá tirava e comia. Punha a aquecer para tirar aquele azeite e comia, era muito bom, muito gostosinho. Os presuntos a gente salgava na arca, tirava-os e pendurava-os para secar, punha-se um bocadinho de colorau, para se aguentarem para mais tarde.