“Não havia onde se ganhar a dinheiro”

Na aldeia, quando a gente já era mais crescida e quando aparecia, chamava a gente, um dia fora, a gente lá ia trabalhar. Uma pessoa precisava e vinha:

- “Olha, ó Rosária, manda-me lá a tua rapariga ou o teu rapaz!”

E a gente lá ia. Ganhava 7 e quinhentos por dia a carregar terra e estrume para as fazendas. Tinha aí alguns 8 ou 9 anos. Para onde eu ia, as velhotas - era para as velhotas - enchiam a terra numa cesta e ajudavam-me. O caminho era bem ruim e já lá estava ao pé delas! Quem me dera poder como podia naquele tempo.

Mais tarde casei-me. Então, ia para os pinheiros. Levava o caixote, as bicas e as estacas e ia com elas às costas para o pinhal meter as bicas nos pinheiros. Primeiro, ia com um ferro desencarrascá-los, tirava-lhe a côdea. Mas não era toda, era assim um bocado. E depois é que se ia pôr as bicas, as estacas e os púcaros. No fim de estar aquilo, ia-se com um ferro, um ferro assim próprio. Tirava-se-lhe um bocadinho, dava para 15 dias. E tinha uma coisa que chamavam botija. Punham aquele líquido naquele bocado que tiravam e depois, em 15 dias, a resina estava a cair para o púcaro e o púcaro enchia. Às vezes, aquele pinheiro que dava mais resina tinha dois púcaros. Iam lá renovar e punham-lhe outro púcaro. Depois iam com uma lata, de 20 ou 25 litros, de pinheiro em pinheiro para colher a resina. Havia, então, uns barris grandes. Vinham-na despejar aos barris. E ganhavam 25 escudos para andarem a carregar a resina e a colhê-la de cada barril. Levava aí algumas oito ou nove latas. Eram 200 litros para ganhar uma miséria. E a resina ia para as fábricas e lá era destilada. Dali é que saía o alcatrão, a aguarrás e essas coisas. Mas praticamente era só eu que andava na resina. Outras mulheres não havia. A necessidade obrigava a gente. Pois, a vida estava difícil e não havia onde se ganhar a dinheiro.

Também trabalhávamos no campo. Depois, para criar a filha, não a criei ao peito, que ela não quis. Eu ia para a fazenda com ela e levava-a num berço. Quando lá andava um bocado, ela queria comer, queria o leite. Então, eu tornava a vir lá de longe com o berço. E eu fui sempre muito reles de carregar à cabeça. Para vir a casa e arranjar-lhe o leite, trazia-a assim ao ombro. Depois tornava a ir com ela para lá para a fazenda, para a agricultura. Era triste...