O senhor cónego Nogueira

A minha avó contava que, quando foi que fizeram a capela da Senhora do Carmo, estava em Chãs d’Égua um padre que era o senhor cónego Nogueira. É aquele busto que está em Piódão. Depois ele já cá trazia muitos estudantes a estudar. Chegou a trazer 70. O seminário era no largo do Piódão, onde hoje é Centro de Dia. Começava aí o princípio da casa. Era uma casa grande e noutra casita ao lado era onde dava a escola. Ai Jesus, Nosso Senhor! Aquele é que era um santo! O cónego Nogueira dizia a missa lá no Piódão por a semana e, ao fim, agarrava e vinha ter ali onde andavam a trabalhar. Trazia uma batina mais velha, chegava lá, vestia-a e trabalhava como um qualquer homem. Com sacho, com martelo, com tudo. A minha avó dizia-me assim:

- “Olha, filhas, eu só em lanchitos, fui-lhe lá levar 18 à Malhada! Fora os almoços que lhe cá dava.”

Naquela altura, a minha avó era a mordoma e depois tinha que dar o comer ao padre. Nós déramos muito de comer aos padres, ai Jesus! É verdade! Ao fim, lá o senhor bispo levou o cónego Nogueira outra vez para Coimbra. Senão, fazia-se aqui o seminário e em Coimbra nada.

Naquela altura, o cónego Nogueira dava a escola àqueles alunos todos. Eram 70 do lado da Covilhã! Era onde as raparigas, a minha avó e as outras, iam levar os ovos. Como andavam uns poucos de seminaristas no Piódão, elas é que lhes traziam a roupa. As mães pediam-lhe para trazerem a roupa para eles cá vestirem. Umas traziam duns, outras traziam dos outros, porque não podia ser só uma sozinha a trazer. Quando eles a tinham suja, não sei se lavavam no Piódão ou se eram elas que levavam a roupa já suja para as mães lavarem.

Contava a minha mãe que houve um rapaz que andava a estudar para padre e ao fim deixou-se. Já estava no altar para celebrar missa, diz ele assim:

- “Para padre bom não nasci, padre ruim não quero ser!”

Então, tirou os paramentos e nunca mais foi à missa. A mãe, coitadinha, meteu-se na cama, até morreu de pena. E era a minha avó que me trazia a roupa desse. Depois ele estabeleceu-se lá na Covilhã, tinha um comércio. Quando a minha avó lá ia ele dizia-lhe assim:

- “Ó senhora Maria Rosa, então porque é que cá não tinha vindo? Porque é que não tinha vindo ver a gente?”

Dava-lhe sempre, sempre, sempre alguma coisa. Mas a minha avó dizia que se envergonhava de lá ir, porque o homenzinho estava-lhe sempre, sempre a dar alguma coisa.