“Não havia cá donde ganhasse”

Depois, ainda cá estive um tempo. O meu marido ainda cá esteve uns mesezitos, também, mas depois foi para Lisboa, pelo mês dos santos, Novembro. O meu cunhado arranjou-lhe para ele ir trabalhar numa garagem. Trabalhou sempre em garagem. Eu fiquei cá, mas já fiquei grávida do menino. Quando estava no fim do tempo, fui para lá, em Janeiro, a 20 de Janeiro. Lá, quando foi à nascença, deixaram-me morrer o menino no Hospital de Almada.

Havia gente da Mourísia lá. Havia e ainda há, mas estão espalhados. Um senhor esteve numa drogaria uma quantidade de anos. Foi para lá pequeno. Outros trabalhavam nas obras e outros foram de cá, não sabiam fazer nada, armaram-se em construtores. Governaram a vida. Iam, porque não havia cá donde ganhasse. Para ganharem alguma coisa, lá era melhor que aqui, que andar pelas serras a cavar. A gente matava o corpo e não se ganhava nada.

Eu trabalhava a dias. Ia trabalhar para casa de senhoras a lavar roupa ao tanque - nessa altura, ainda não usavam máquinas -, esfregar-lhes a casa de rabo para o ar com palha-de-aço, dar cera e limpar o pó.