“Fui para a Suécia”

Em 1966, fui para a Suécia. Tive uma oportunidade. Tinha lá um irmão e ele mandou-me um contrato de trabalho para ir trabalhar ao pé de onde ele estava, numa fábrica de pedra, granito, serração e “polição” de pedras para igrejas, cemitérios, campas. Tudo isso se lá fabricava. A primeira vez para lá, fui de comboio. Demorei um dia e uma noite. Foi rápido. Tinha lá um outro passageiro português para a Suécia e fôramos. Só tivemos uma mudança na Alemanha. Quando entramos na Suécia, o contratador passava os contratos para as pedreiras, que era lá no norte. O comboio andou o dia inteiro até chegar lá donde eu ia trabalhar, onde tinha o contrato. Depois, tinha lá alguém à minha espera, o encarregado. Mas, como modifiquei o horário, à hora que lá cheguei não estavam à minha espera. Procurei um autocarro que me levou perto da pedreira donde eu estava, mas já na Noruega. Depois, o condutor disse a um homem que me levasse lá ao Ak Ferstrom que era a fábrica. Ele passou-me num barco por um lago grande e foi-me lá deixar no sítio, onde trabalhavam 20 portugueses, tudo na pedra. Ao outro dia de manhã, o encarregado levou-me à estação e voltei todo o dia a andar cá para o sul, para Sölvesborg, onde trabalhava o meu irmão.

Não foi complicado adaptar-me lá. Um bocadito pior foi eu, nessa altura, ainda não ter carta. Só tinha a carta daqui, mas quando cheguei à Suécia, não dava para lá. Tive que tirar lá novamente. Então, a princípio foi um bocado difícil, a forma de transportes para o trabalho. A Suécia não é como aqui. Era um pouco mais frio. Eu trabalhava em Karlshamn, mas morava nos arredores, a 10 quilómetros. Tinha que vir às compras de bicicleta. Nessa altura ainda não tinha carro. Para ir de bicicleta de Inverno era um bocado ruim, mas ainda fiz isso bastante tempo. Às vezes, ia com os colegas. De manhã, ia sempre. Depois, acabei por tirar a carta e comprar carro. O trabalho já era mais fácil.

Ainda aprendi a língua. Não fui à escola, porque não tinha vagar, não tinha tempo, mas a minha esposa ainda andou 240 horas na hora do trabalho lá na escola dos sindicatos. Eu não tive isso, porque não era preciso, senão também tinha. Eles lá nas fábricas também punham escola, mas eu não andei lá. Não era necessário.

Os suecos são inteligentes, simpáticos e com um nível de vida mais ou menos. Não é assim tão difícil como aqui em Portugal. Tudo mais fácil. Eu achava tudo mais fácil. Aqui, as pessoas não atendem bem cá as gentes, seja que empregos forem. Lá, são muito atenciosos em tudo. Podiam não ligar a um estrangeiro porque falava mal ou isso, mas não, muito bons. Nunca tive problemas de chegar a um lado qualquer e ser mal percebido ou isso. Os trabalhos, os colegas, suecos e estrangeiros tudo mais ou menos dentro das normas. Achei uma civilização muito boa.

Trabalhei seis anos naquela companhia na pedra. Depois, fechou e eu tive que procurar outro trabalho. Fui para outra fábrica de pedra. Vim estar aqui um ano em Portugal e quando voltei ainda fui para essa mesma companhia da pedra, que era em Karlshamn. Depois, essa companhia já tinha fechado em Sölvesborg e eu tinha ido para Karlshamn, para outra fábrica deles. Tinha lá mais três ou quatro fábricas de pedra noutras cidades. Aonde eu trabalhei, tinha pedreiras logo ao pé. Extraíam aquele granito, aquela pedra. Lá, era o sítio maior das pedreiras e tinha estas fábricas de serrar e polir pedra. E ainda tinha mais nalguns três sítios lá na Suécia. Exportava para América, para todos os lados. Para todas as nações, havia pedras feitas por a gente. Era uma empresa boa, na altura, mas, depois, o velho morreu e tudo aquilo foi destruído. As casas onde a gente morava, a casa do dono, tudo... Lá não é como aqui. Foi tudo destruído e levado para aquelas covas das pedreiras. Desapareceu tudo. Ficou o terreno limpo. Aqui ainda se faz destruição nas aldeias, mas não se leva, deixa-se ficar para lá ao monte, mas lá, fazem limpeza às coisas todas. Quando fechou, eu vim para a Volvo trabalhar para o pé do meu irmão, também perto de Sölvesborg.

Lá, trabalhava numa máquina, onde fabricavam radiadores dos automóveis. A companhia punha o que estava a trabalhar a ensinar o empregado dois ou três dias. Depois já estava apto a fazer o trabalho. Vinham rolos grandes de lamela, em redondo, que é uma espécie de fita. Aquilo é colocado na máquina, que faz aqueles quadradinhos. Depois, está sempre a sair aquele paquete. Cada radiador vai encaixado naquele paquete, passa pelo forno que leva “sirra”, lá chama-se assim, cá é solda, que é ácido para soldar. Fica aquilo tudo soldado. É tudo cheio de canos por dentro e segue dali a linha toda. Eu trabalhava na máquina, o meu irmão também e um grego e um sueco. Trabalhávamos quatro nessa máquina.

A vida lá era trabalhosa também. Na fábrica da pedra, nas máquinas de serração, eram dois turnos. Eu trabalhava num e um português trabalhava noutro. No turno que eu estava à noite a trabalhar, saía às dez horas. Chegava a casa, comer. O encarregado - era alemão - quase todos os dias às nove horas, já estava a dizer à porta:

- “Ó Gonçalves, venha para baixo, que eu tenho lá muito que fazer!”

Levantava-me, tomava o café, em vez de ir pegar às duas, às vezes eram dez, 11 horas, já estava a trabalhar até à noite. Era uma vida de trabalho. Depois, fins-de-semana era de ida às compras. Era uma vida mais ou menos isolada, como por aqui.

Sentia saudades, mas, depois, habituei-me. Depois de quatro anos, tinha lá a família. Vinha cá todos os anos, em Junho, quando tínhamos as férias. Às vezes, estávamos dois, três anos sem cá vir e era um bocado trabalhoso. Vinha-se de férias por ver a família e vir dar o passeio. A gente lá estava sem vir até cá. Já apetecia dar por cá uma volta. Vinha de carro. Fiz a viagem de carro uns quatro anos. Depois, já mais para o resto, passei a vir de avião.