“Aqueles que eram pobres, não se importavam deles”

Quando íamos para a escola, íamos daqui para a Moura da Serra. Também andámos no Sobral Gordo. Mas primeiro andámos na Moura, que é esta terra que está aqui atrás. Fazíamos uma hora a pé daqui para lá. E quando estava assim temporal? Às vezes, os barrocos levavam água com muita altura. A gente, pequenitos, com 6 anos, como é que atravessava os barrocos? Eram os mais velhos, que já tinham a quarta classe, que passavam os mais novos às costas. Eles já tinham mais força, já passavam a gente. Outras vezes, saltávamos os barrocos lá num sítio que é mais estreito. Saltávamos de um lado para o outro. E, mesmo assim, ainda vai muita água porque, naquele tempo, esta estrada aqui por cima não existia. A água vinha remansada da serra, juntava toda. E agora já não. Agora, como fizeram as estradas, ajunta muita água só nos barrocos, junto do Aleixo. Está muito modificado.

Na Moura, não era uma professora. Eram professoras. Uma professora dava escola da parte da manhã a 50 alunos. A de tarde também tinham 50 e tais. A da parte da manhã era primeira e segunda. E a de tarde era terceira e quarta. Eram quase todas lá do pé de Coimbra. Umas malhavam, batiam muito. Outras batiam pouco. Conforme. Outras, às vezes:

- “Ai, não sabes? Ficas na mesma.”

Por aqueles que tinham mais alguma coisa, que iam dando, interessavam-se mais. Aqueles que não davam nada, que eram pobres, não se importavam deles.

Ainda aqui houve escola uns anos. Era aqui numa casa. Era uma casa “sobraçada”. Tinha sido uma taberna. O homem, quando fez a casa, era alfaiate. Pôs ali uma tabernita, mas aquilo não deu nada. Depois, foi lá para as Meãs e emprestou para a escola o andar de baixo. Naquele tempo, nem o petróleo a professora comprava. Não comprava nadinha! Nem o petróleo, nem renda de casa, nem nada. O povo dava-lhe tudo para ela se governar.

Às vezes, antes de eu ir para a Moura, a minha avó ia roçar o mato. Tínhamos que o ir lá buscar também. E, quando vínhamos da escola, as nossas mães mandavam-nos ir ter onde andavam a trabalhar. É claro, andavam a trabalhar, tínhamos que andar até à noite a ajudar. À noite, vínhamos fazer as coisas à luz do candeeiro. O tempo era pouco para estudar, porque também depois atacava o sono. E assim aprendêramos pouco.