“Para ganhar alguma coisita, dei cabo de mim”

Tinha aí alguns 9 anos ou 10 quando fui servir, que foi ao fim de vir da escola. Primeiro, estive em São João, mas não estive lá muito tempo. Não sei se foi um ano, se foram dois. Depois, fui para o Porto Castanheiro. Aí é que já estive mais tempo, numa casa que era do meu tio Zé Ramos. Andava lá a apanhar o mato e ia à lenha quando era preciso. E, às vezes, ia guardar umas cabeças de gado ou ovelhas com outra mulher, também de lá, que já morreu. Quando era nos baldios, a gente trazia-as “pia além” e, às vezes, punha-se lá sentadas a rir-se e tudo.

Nesse tempo, havia muitos lobos. Daquele lado, andava uma vez um rapaz, que morava ali quase ao pé de mim. Era a casa que agora é da Comissão. E ouviu-se:

- “Ai, lá vão os lobos! Lá vão os lobos!”

O lobo lá levou um cordeiro ou um carneiro lá “pia cima”.

Agora que me lembro, estive também no Sardal. Mas daí já tinha mais idade. Os meus 16, 17 anos. Estava lá com uma mulher que tinha três filhos. Ainda a ajudei a criar uma filha.

Quando regressei cá à terra, já tinha uns anitos. Já devia ter os meus 20 anos ou mais. Andei a vender sardinha quando ainda tinha os filhos. Ia daqui a subir além uma ladeira “pia cima”, lá para o Tojo. Ia à Fórnea e de lá vinha para o Soito da Ruiva, para o Sobral Gordo e depois é que vinha para aqui. E foi assim a minha vida. Para ganhar alguma coisita, dei cabo de mim. Agora fiz um exame e o médico disse:

- “Você está toda escangalhada. A coluna está toda escangalhada.”