“Não tinha memória”

Fui andar na escola. Eu penso que não cheguei a fazer a segunda porque, naquela altura, eram muitos! Era a escola na Moura da Serra. Ainda está na Moura donde eu andei. Agora é uma casa que acho que também é da Comissão e a escola é mais para baixo e maior. É grande. Mas no meu tempo era pequena como uma casa. Agora, já não tem alunos. Lá andam só dois. Vem aqui a camioneta buscá-los.

Depois, a gente, às vezes, em lugar de aprender, não aprendia, porque não tinha memória. Então, mandavam aqueles que sabiam mais aos outros:

- “Ó, vai à fulana que ele dá-te lição!”

Que já sabia mais.

- “Oh, ela não sabe!”

Tornava outra vez na mesma:

- “Ai, ela não sabe!”

Aprendi pouco. Eu não tinha memória como tinha uma filha que cá tenho. Aquilo tinha um mimo que ainda hoje é o dia que tenho pena de não a deixar aprender, que ela podia ser professora. Aprendia bem. Ora, na altura, como tinha os outros, não a deixei estudar. E o meu marido também tem memória. Saiu a ele.

Tinha alguns 9 anos quando saí da escola. E não meteram lá mais nenhum irmão meu. A minha irmã não sabe, a outra também não. Como não eram obrigados… E, se era preciso, às vezes, ficar com algum rapaz ou rapariga que fossem meninos, sempre fazia a gente o bem uns aos outros.

Já era crescida, aprendi com uma que está em Lisboa, que se chama Maria Nunes, que é minha prima. A mãe dela era irmã do meu pai. Elas é que me andaram a ensinar a ler e depois lá aprendi mais alguma coisa. Tinha para aí alguns 20 anos, então, se calhar. Quase que fazia uma carta. Depois, comecei lá a ler nuns livros que me vêm de Lisboa, duma campanha que lá há. E os livros vêm tudo com o nome e com o retrato da Nossa Senhora de Fátima. E daí eu ler. Agora, já sei mais um bocadito.