Tempos de mudança

Havia mais pessoas. Dantes havia mais e bem mais, em qualquer terra. Há terras que nem têm, a bem dizer, nenhuma. E a Mourísia ainda tem. A terra da minha mulher nem tem já lá ninguém.

Os terrenos à volta não é como antigamente. Antigamente era tudo cultivado e agora não. Há muitos que acamam, não podem. Já estão como eu, velhos como os trapos. Os trapos são velhos e as pessoas sendo velhas também são como os trapos.

Gosto mais de estar na Mourísia do que se fosse para outro lado onde não se pudesse fazer nada. Faz bem a gente mexer enquanto puder. Que a gente se não mexer torna-se torto das pernas, disto e daquilo. Se a gente se mexer, está claro, parece que até anda melhor.

Quando estava tudo amanhado era pior. Havia mais fome. E de hoje para amanhã não sei se não virá a dar isso. Pois é. Isto não se vê a coisa para melhor. Vê-se bem que isto que não está nada bem. Só um cego é que não vê. De hoje para amanhã não sei o que virá a dar.