Colhereiro e agricultora

O meu pai era colhereiro. Fazia colheres de pau. Tinha umas ferramentas próprias para as fazer: uma machada, uma enxó, uma legre e uma faca fina e dobrada. Já se sabe, não é uma faca direita, é uma faca com uma curva. A machada era para dar os primeiros retoques. A enxó servia para tirar a casca por dentro da colher, para fazer a pá. A legre alisava por dentro. E com a faca alisava-se. Depois de as fazer, o meu pai vendia-as para uns depósitos, onde uns senhores as juntavam. Agora ainda há aqui um nas Luadas mas, nessa altura, havia na Esculca, na Benfeita, no Sardal... Aos domingos, íamo-las lá levar a esses senhores à Benfeita ou à Esculca e depois o cliente vinha-las lá buscar. Nós só as deixávamos. Eles pagavam-nos e depois os clientes encomendavam-nas e levavam-nas. Fazer colheres foi sempre a vida dele. Mas também passava alguma parte do tempo no campo. Não era só fazer colheres. Quando era preciso - porque havia coisas que se estragavam e tinham de ser feitas naquela altura - ele ia regar ou uma coisa assim. A vida dele era esta. Mas as colheres é que eram a safa. Se se aviasse da fazenda, não dava. Mas como fazia colheres, tinha sempre uns tostõezitos.

O meu pai também andou em Lisboa. Trabalhava no mercado, na Praça da Ribeira. Levava a fruta para dentro das camionetas, dos chamados saloios. Depois iam lá para dentro e vendiam-na. Traziam-na para os clientes cá para fora. A vida dele foi assim enquanto andou em Lisboa. Esteve lá uns 20 anos. Veio em 1940. Mas vinha cá, não estava sempre lá. Vinha cá passar uma parte do tempo, por causa da minha mãe. Depois voltava e só em 1940 regressou de vez. Mais tarde foi a Lisboa, mas só de visita. Nunca mais foi lá para trabalhar.

A minha mãe trabalhava no campo, era agricultora. Tratava do gado, das ovelhas, das cabras. Cultivava a fazenda. Na altura, plantava milho, batatas, feijão, cebola... Tinha aquelas coisas para nós comermos. Não vendíamos nada. Aquilo era só para nós. Às vezes ainda vendíamos uns alqueires de milho, mas não era assim muito. E era o que ela fazia. Era tudo o que fazia parte da agricultura.