“Os meus pais não sabiam ler nem escrever”

Os meus pais não sabiam ler nem escrever. Quando eles eram jovens não havia escola na aldeia, então os homens só aprendiam quando iam à tropa, mas o meu pai não foi. Como não foi, não aprendeu, no entanto ele sabia ver as horas. Tinha um relógio de bolso e sabia que se os ponteiros estavam numa certa posição, eram determinadas horas, se estavam noutro lugar, eram outras horas. Também conhecia muito bem o dinheiro. Já o meu tio, irmão dele, foi à tropa e aprendeu a ler e a escrever.

A minha mãe ainda aprendeu a ler e escrever. Quando nós éramos mais pequeninos - ainda na primeira, segunda classe - nós estávamos a ler ou a escrever e ela dizia:

- “Este é o ”O“, este é o ”A“, este é o ”1“, este é o ”2“.”

Ela sabia, inclusive, fazia o nome dela, mas depois, deixou de praticar e esqueceu-se. Para continuar a estudar, tinha de ir para Arganil. E para Arganil eu não podia ir e vir todos os dias. Os meus pais não se importavam, mas eu nunca quis ir. Disse:

- Não! Ir para Arganil, ficar lá a semana toda...

E ao fim-de-semana também era complicado vir, porque, não havia transporte. Nunca quis ir. Mas sempre pensei: um dia que eu vá para algum lado, e que possa, vou trabalhar e estudar. E foi isso que fiz quando fui para Lisboa, em 1989. Estava lá há pouco tempo quando o meu pai ficou doente com uma leucemia. Eu nem tinha cabeça nem tempo para estudar. Ele era seguido em Lisboa nas consultas de hematologia. Ia até Coimbra e eu sempre que podia vinha de Lisboa a Coimbra buscá-lo e trazê-lo. Foram dois anos de luta, e, ao fim de dois anos faleceu. Assim que me recompus, decidi estudar. Disse:

- Bom! Hei-de fazer o que puder. Vou até ao nono ano e logo se vê.

Quando cheguei ao nono ano pensei:

- Mas eu agora podia avançar mais um bocadinho... Eu até gosto...!

Sempre gostei muito de aprender. Ainda hoje gosto. Fico muito contente cada dia que aprendo uma coisa nova. Fui até ao 12º ano, e, quando terminei o 12º, fiz um curso de informática à minha conta, depois candidatei-me à universidade. No primeiro ano que concorri não entrei, também só fui fazer provas na segunda fase em Setembro. No ano seguinte, fiz as provas na primeira fase e entrei com 16,5 no Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE) em Sociologia e Planeamento. Também tinha escolhido Sociologia, mas eles puseram-me em Sociologia e Planeamento, não me importei nada, porque o planeamento também é muito importante. Gostei muito das cadeiras de Planeamento e de Avaliação de Projectos. Neste momento falta-me defender a tese de mestrado. Estava a fazê-la em Fevereiro de 2008 quando a minha mãe ficou doente, levei-a para Lisboa, não tinha tempo nem tinha cabeça para me dedicar à tese, por isso desisti. Já me reinscrevi, vou defendê-la em 2009.