“As máquinas eram os nossos braços”

Quando foi aos 20 anos a minha madrinha levou-me para Lisboa. Depois só estive um ano e meio ou dois solteira, casei tinha feito 22. Então estive lá na casa dela, depois casei lá na igreja do Lumiar.

Primeiro estive com a minha madrinha e depois de casar tive a minha casa, depois tive o meu filho. O meu filho nasceu em 1950 e depois fui trabalhar, claro. Não era só com o ordenado do meu marido nesse tempo que se vivia. Então depois fui trabalhar para uma fábrica, que ainda hoje sou reformada de lá, de fazer os mosaicos do chão. Aqueles mosaicos às cores, aos quadrados. Era uma cerâmica. Fui para lá trabalhar. Tenho um mal, foi daquela força que se faz nas fábricas, a pegar e a apertar. Agora as fábricas são todas ao poder de máquinas, mas antigamente as máquinas eram os nossos braços, era a gente. Eu trabalhava com uma forma. A forma vazia pesava 45 quilos, mas depois a gente fazia aqueles coisos do chão daqueles que têm os desenhos vermelhos e brancos. Tinha que se pôr um separador e dentro daquele separador a gente punha num quadradinho a tinta tal, noutro quadradinho a tinta tal, era assim. Tinham que se fazer uns tantos. Se fosse dos lisos tinham que se fazer outros tantos. Depois de estarem feitos, antes de estarem colocadas as tintas, ia a uma prensa e a prensa era apertada a 300 quilos. Depois tirava-se aquilo, tirava-se os mosaicos, punha-se nas grades e depois as grades, pegava-se com 12 mosaicos iam para o banho, que é o banho do brilho que têm esses mosaicos do chão.

Fui trabalhar e estive lá até 45 anos. Mas também digo, era quando Lisboa era Lisboa. Agora já não é. Agora aquilo é um inferno. O meu filho diz-me assim:

- “Ó Isaura podias ir lá passar o Inverno.”

- Não. Deixa-me estar aqui que aqui estou mais sossegada. Deixa lá estar os carros e os fumos e deixa-me aqui estar que eu estou aqui melhor nesta idade.

E eu também não me dou nos carros. Sinto-me muito mal.

- Deixa-me cá estar e tu vens cá quando puderes.

Ele vem cá muita vez.

Depois fui reformada ainda cedo com 45 ou 48 anos por causa da minha doença, porque não podia dos ossos. Não podia pegar nas coisas. Ainda estive lá e depois vim para a Benfeita mais o meu marido.

Depois o meu filho formou-se, foi fazer o doutoramento e eu vim para aqui e tenho cá estado. Ainda cultivei as minhas terras que agora estão silvas, claro, mas agora já há muito tempo que não faço nada porque tenho um mal nos ossos.