“De xisto por fora e por dentro”

A minha casa era uma das últimas no cimo da povoação, que hoje já não existe. Foi deitada abaixo, foi reconstruída e é um tio meu que habita nessa casa, já totalmente reconstruída. Mas era uma casa de três pisos. Tinha a loja que era onde se guardavam os produtos agrícolas, os vinhos e as aguardentes, tudo isso. Depois tinha o primeiro andar, amplo sem divisões. Quando eu era miúdo já éramos muitos irmãos. Então, naquele tempo, quando havia necessidade, esse próprio andar servia, ao mesmo tempo, para guardar alguns produtos agrícolas, como as batatas, e ainda servia de habitação também. Havia pessoas que necessitavam de ter lá uma cama e dormir lá. Depois tinha o último piso com uma cozinha, uma sala e dois quartos pequeninos. Eram quartos que, praticamente, só cabia uma cama. Não havia possibilidade de meter outro tipo de mobiliário. Era uma casa pequena. Era à imagem daquilo que são as casas do Piódão. Nós vemos a maioria delas são casas pequenas, com necessidade de fazerem várias divisões porque, normalmente, as famílias eram numerosas. Os casais tinham muitos filhos e as casas sendo pequenas tinham de se dividir. Muitas vezes, os filhos mais pequenos, eu lembro-me, dormiam no quarto e até na cama dos pais. Mesmo com 3, 4 anos. Não havia divisões na casa que chegassem, quando eram famílias com seis, sete, oito filhos, o que acontecia muito. Se fossem três raparigas dormiam as três raparigas numa única cama. E, às vezes, os rapazes acontecia o mesmo. E eram camas pequenas. Eu lembro-me que era miúdo e isso acontecia.

A casa era feita em xisto por fora e por dentro. Eram as construções que se faziam naquele tempo. Todas as casas eram feitas em pedra por fora e por dentro. A partir da década de 60, penso eu, é que começou a chegar a estrada mais próximo, e já conseguiam ir buscar a telha e o tijolo. Então faziam em pedra por fora para manter a traça e faziam com tijolo por dentro, principalmente, quando começou a haver água canalizada, na década de 70. E começou a chegar a electricidade e depois as pessoas para meterem os cabos de electricidade e os tubos da água cortavam o tijolo. Era mais fácil do que estar a cortar xisto. Antes disso muitas delas nem tinham protecção por dentro. Na década de 40, 50 podia existir uma ou outra por dentro, com os buracos das paredes já um bocadinho rebocadas com uma areia que eles conseguiam arranjar nuns terrenos, numas zonas específicas. Aquilo não era bem areia, era um bocado de entulho mais macio e com uma argamassa qualquer, conseguiam tapar as paredes para não entrar tanto frio. As quatro portas, a da loja, do armazém agrícola, do andar intermédio e do último andar eram em madeira de castanho, mas madeira ao natural. Nunca levaram pintura nenhuma.