Foi o meu bisavô que a fez em 1912, 1913 talvez

A minha casa de miúdo não era muito má. Mas está já velha, porque foi o meu bisavô que a fez em 1912, 1913 talvez. Gastou 900 escudos! Mas era a maior casa que havia no Piódão! Era, já há maiores. É onde eu vivo agora. O meu bisavô foi sete anos para Lisboa. A pé lá para o outro lado, para o Seixal. Havia lá uma fábrica da cortiça e havia aí alguns que iam a pé e vinham. Como ele esteve lá sete anos sem vir e tinha mulher, tinha filhos e tinha aí despesas, a mulher arrancou, foi lá ter com ele. Vieram os dois! Então ele trouxe o dinheiro. Depois foi para o Seminário do Fundão, foi fazê-lo, 14 anos. Começou-o de raiz. Não foi só o meu bisavô, foram muitos daqui da zona, que eram pedreiros. Esteve lá 14 anos. Porquê? Empenhou-se em 900 escudos para fazer a casa. Mas a coragem que havia no homem de antigamente. Eu hoje, por exemplo, com as facilidades bancárias que há, não ia meter-me numa aventura daquelas. Estar-me a empenhar toda a vida para nada... Ao fim ao cabo, quem gozou aquilo foram os filhos, os netos, os bisnetos...

Era uma casa que dava para todos e até tínhamos mais outras. Mas tínhamos quarto, por exemplo, para dois a dois. Havia aí alguns que não tinham mas, pronto, isto é aqui, é em todo o lado. Hoje, na África, dorme-se na rua, na Ásia, em Lisboa também. Portanto, acho que apanha a totalidade do planeta. Não é só no Piódão.