“Era o miminho da cantareira”

Eu tinha um irmão e uma irmã. Dávamo-nos bem uns com os outros. Eu era o mais novo. Era o miminho da cantareira. O meu irmão tinha mais 14 anos do que eu e a minha irmã, dez. Quase que fazia o que queria. Fui criado diferente deles, com mais fartura. Tínhamos a casa farta. Milho, feijão e tudo. Sempre comíamos com fartura. Qualquer pessoa aí da terra sabe perfeitamente que era verdade. Nunca conhecêramos o - diz o povo - pão que o Diabo amassou. E às vezes ainda dávamos aos outros. Outras vezes vendiam, conforme.

Antigamente, havia muitas crianças. Quando eu fui para a escola, era umas 40 ou mais. Recordo-me também dos jogos que a gente fazia. A alegria que a gente tinha aí uns com os outros. Jogar ao feijão, o jogo da malha e - chamamos nós - o coque. Uma alegria! Era diferente de agora. Agora só se entretêm em bicas e cervejas e jogar a bola. Primeiro, nem tínhamos onde jogar a bola. Eram outros jogos.

Dantes, não havia brinquedos para ninguém. A chucha era de açúcar. Agora, usam aqueles coisos de borracha para pôr nos miúdos. Antes, eram umas rolhas de açúcar. E a gente entretinha-se. As bolas, íamos comprar ali à Senhora das Preces, quando era o dia da romagem. Bolas pequenas, que a gente ia comprar para jogar, às vezes, na escola. Era o que entretinha. E bolas de farrapos. Andava uma meia, metia lá outras coisas dentro e era uma bola de farrapos. Tinha que ser assim. Não podia ser de outra maneira. Mais brinquedos, não havia. Não havia dinheiro como agora. O dinheiro que cá aparecia era para comprar uma sardinha ou outra coisa. Era diferente. Era vida!