“Iam para fora ganhar alguma coisa”

Os meus pais também eram do Piódão. Chamavam-se Manuel de Oliveira e Helena da Piedade. Trabalhavam no campo, na agricultura. Cultivavam, como agora, milho, feijão, batatas... E a minha mãe também tinha que ir à lenha, cuidar dos animais e tratar dos meninos, de mim e dos meus irmãos. Mas, às vezes, quando aparecia trabalho, iam para fora ganhar alguma coisa para a gente, porque nós éramos pequeninos e muitos. Assim muitos, muitos não éramos, mas tinha que ser.

Eu era pequenina, mas lembro-me que, no tempo do minério, os homens iam para as Minas da Panasqueira. E a nós o que nos valia ainda era o meu pai, que também lá andava, na altura. Agora é que não me lembro já disso, mas ele contava que era um trabalho duro. Andavam ali muito arriscados. Tinham que andar dentro de uma mina e traziam uns candeeiros acesos para verem, senão não viam nada. Eram uns candeeiros já próprios. Ainda assim, de gente de cá, não ficou lá ninguém. Mas morreu muita gente nessa altura. Caíam as pedras para cima deles e depois ficavam lá largados. Lembro-me muito bem ainda desse tempo. Foi no tempo da escravidão, porque houve dois anos da fome.

Mas recordo-me do meu pai ir lá à Mina e trazer-nos sempre assim uns bolinhos. Sempre que nos trazia alguma coisa, a gente ficava toda feliz! Quando ele chegava a casa, a gente ia logo abraçá-lo e beijá-lo! Já sabíamos que ele nos trazia alguma coisa melhor do que o que a gente comia. Nesse tempo, os homens das minas vinham todas as semanas para levarem o comer para toda a semana. O que era preciso para lá tinham que vir buscar a casa. E também vinham visitar as famílias. Não sei quanto tempo demoravam da aldeia às minas, mas era muito tempo e iam a pé.

Os meus pais tiveram cinco filhos. Tenho duas meninas no Céu. Chamavam-se Deolinda e Conceição, morreram as duas. Uma ainda a conheci, a outra já não. Estão no Céu a rezar por mim! E tenho dois irmãos. A mais velha sou eu, depois há o António e o José. Este mais novo era gémeo com a menina que morreu.