“Para cima do lombo, a bater prancha”

Depois fui para Torres Vedras. Lá só estive um ano. Acabado esse ano fui para Lisboa, a fazer distribuição da batata. Depois fui para a estiva. Mas não era efectivo. Estava sem cartão. Só trabalhava nos dias que havia descargas, que havia mais trabalho a fazer. O pessoal que não era encartado, que não tinha o cartão de estiva, só fazia o que os outros não queriam. Íamos à caça do conto. Mas primeiro eram contados o pessoal que era efectivo, quer dizer, que tinha o cartão de estivador ou de tráfego. Os que trabalhavam em mar eram os estivadores e os que trabalhavam em terra eram os do tráfego. Quando havia muitas descargas, vinham à rua chamar o pessoal que não era encartado. Aquilo era só para os serviços de alombar. Alombar é tudo o que vem para cima do lombo, a “bater prancha”. A descarregar o bacalhau, a farinha, o trigo, a batata estrangeira, o cimento... O bacalhau, nessa altura, antes de fazer a Ponte 25 de Abril, vinha nos barcos e a gente é que o tirava. As secas eram em Alcochete. Depois lá vínhamos nos barcos para Lisboa e era lá que se descarregava. A farinha também era toda descarregada lá. Tudo às costas. E eu andei sempre nisso. Alombei lá muito. Ainda lá andei um ano naquilo. Mas só na falta dos outros. Depois fizeram a Ponte 25 de Abril, tiraram aqueles trabalhos todos. As camionetas do cimento iam à Secil, no Carregado. Já não era preciso estar ali a descarregá-lo. O bacalhau e a farinha também. Então o pessoal da rua acabou todo. Eu chateei-me com aquilo, porque havia semanas que só fazia um dia. Então fui para o Norte.