“Deu bons princípios à mocidade”

Naquele tempo, o senhor prior vivia cá. Havia um padre para cada freguesia. E como aqui era freguesia, estava cá um padre permanente. Tínhamos missas todos os dias e as pessoas pagavam-lhe uma côngrua. Ainda se paga hoje, também. Depois, vinham os santos. Era o magusto. Davam uma recompensa em milho, em castanhas ou em cereais. Vinha a Páscoa, era o folar. Tirava o folar. Cada um punha uma mão-cheia de ovos e, às vezes, uns queijos também. Ele tinha sustento suficiente. Vivia como um padre!

A igreja já levou muitas reparações. O cónego Nogueira fez aquela fachada. Não sei como era dantes. Quando eu me lembra dela, já assim era. Tinha árvores centenárias de um lado, do outro, da frente e também algumas atrás. Aquilo até estava bonito, na altura. Lembra-me de um acrescento, aquela parte de trás que está mais alta. Não era assim. Fizeram aquilo e aqueles pilares para imitar os da frente. Mais tarde, deixaram degradar as coisas e tiraram-lhe os pilares. Fizeram uma asneira grande, porque pelo arquitecto que fez aquilo dava-lhe mais beleza. Aquilo foi tirado quando foi de uma reparação. Naquela altura, ainda não havia escoamentos, não havia nada. Entrava água junto às colunas. Como não eram capazes de vedar a água, toca de as botar abaixo para proteger aquilo. Era uma coisa simples, mas pronto... A Comissão que lá estava na altura resolveu assim. Atrás, é um forno que era particular. Também cozia muita broa ali.

A gente ia daqui com os olhos fechados, mas levávamos uma coisa boa. Era a religião. Agora, considero que, realmente, deu bons princípios à mocidade. As pessoas que foram daqui, todas progrediram. Foram de marçanos. Naquele tempo, era levar a mercearia às casas. Andaram de marçanos, mas hoje a maior parte deles está tudo estabelecido com bons estabelecimentos e com vida bem constituída. Eu lá no meu trabalho também. Cheguei a ser um operário especializado e até monitor. A gente progrediu, porque levava aquela força de vontade de trabalhar. Levava a educação que era muito bonita. A gente respeitar as pessoas. Agora alguns, a maior parte deles, quanto a mim, são malcriados. Não respeitam nada. A malta que ia daqui era bem recebida, por causa da educação que levava daqui. Nós tínhamos medo do senhor prior. E os pais, em casa, colaboravam com ele. Padre e família. Quando saí daqui, a recomendação que o meu pai me fez foi esta:

- “Olha que a gente nunca se agrada ao que é dos outros. Isso não dá resultado. O que é dos outros, é dos outros. Não se tira nada a ninguém! Não se rouba nada a ninguém!”

E deu resultado. Nunca me agradei lá do que é de ninguém. Trabalhar, trabalhava! Fartava-me de trabalhar, porque eu queria alguma coisa. Mas roubar, nunca roubei nada. E dei-me bem com isso. Dou graças a Deus por ter seguido esse percurso. Com esta idade também é recompensada.