“Aprendi a ler”

Eu fui à escola. Mas, na altura, os professores tinham grande dificuldade em se deslocarem para o Piódão. Na minha altura, era ao pé da igreja, onde hoje é o Centro de Dia. Era a residência do pároco e a escola, tudo seguido. Recordo-me que a escola tinha umas cadeirinhas muito velhinhas. Depois, comprávamos uma pedra com uns caixilhos. Na primária, a gente partia aquilo. Aconteceu-me a mim e aos outros. Era um bocado de pedra, de lousa preta, onde escrevíamos e apagávamos. Cuspiam, apagavam, voltavam a escrever. E todo o dia assim. Na altura, as professoras davam cada tareia nas mãos, que punham as mãos a cair para o lado. Era com uma régua, uma vara estreitinha. É curioso, uma vez, diz a professora:

- “Há-de me trazer uma vara.”

E um gajo arranjou-lhe uma vara comprida, muito comprida. O tipo que foi cortar a vara a um sítio ruim de ir, que só quase um gato lá ia, foi o primeiro que levou com ela na cabeça. Mas eu pouco andei na escola, porque, infelizmente, as famílias eram muito grandes, não havia onde se ir ganhar. Era preciso vestir e calçar e não havia. Um ia para uma terra servir, outro ia para outro lado trabalhar, a guardar cabras. Eu andei nisso muita vez até que depois fui para o Alentejo. Mas ainda aprendi a ler.