“Era doloroso”

Comecei por andar numas camionetas de Lisboa ao Porto. Íamos à Rua do Freixo, ao Porto, carregar o esmalte lá numa fábrica, que já fechou. Ninguém podia lá tirar uma cafeteira. Eles tinham um contrato. Éramos nós que íamos tirar tudo. Era em Oliveira de Azeméis, no Centro Vidreiro, a uma fábrica em cima do pinhal e ao armazém cá em baixo na vila. Na altura, aquilo era meia dúzia de pessoas. Hoje, a vila é uma cidade! Faço ideia como é que aquilo está. Íamos lá e carregávamos o vidro para levar aos armazéns em Lisboa. Depois, voltávamos novamente.

Aquilo era doloroso. Carregar, levar aos armazéns a Lisboa, descarregar, ir outra vez lá para o Porto e depois tornar a Lisboa. Não havia cama. Só se encostava o carro à borda da estrada, um pedaço, para passar pelas brasas e mais nada. Na altura, a democracia era outra. Ninguém ia assaltar a gente. Perguntavam todos com muita delicadeza:

- “Ó colega, é preciso alguma coisa?”

- Não, obrigado, estou só a descansar um bocado.

E hoje não há isso.

Depois surgiu uma hipótese de ir para uma oficina trabalhar na reparação de navios.