Um mercado na Avenida de Roma

Então, passámos para a Avenida de Roma e tomámos a casa, uma frutaria. O meu marido toda a vida teve coisa do negócio. Gostava muito de ter um negócio. Então, houve um primo meu que nos disse que havia lá uma casa em trespasse. O meu marido foi ver e gostou. Tomámos a casa. A minha mercearia era Mercado de Roma. Dava muito trabalho. Tinha uma capoeira muito grande de criação viva e eu é que tinha que matar, depenar e partir para o balcão. Vendíamos frutas, hortaliças, vinho... Vendíamos de tudo! Agora diz-se os minimercados, mas naquele tempo não era. Era uma casa muito bem afreguesada e a gente também tinha muita simpatia para os fregueses. O meu marido nisso era uma pessoa muito asseada, muito jeitosa.

Fôramos nós que começámos a vender pinheiros em Lisboa para as árvores de Natal. Nessa altura, éramos os únicos. Tínhamos um terreno muito grande em frente da casa, onde hoje está um grande prédio. O senhor construtor era muito nosso amigo e dava-nos ordem para lá pôr os pinheiros. No Natal, vendíamos duas, três camionetas deles. O meu marido estava na venda dos pinheiros e na venda da casa até tarde. Às vezes, ficava lá a guardar, porque, já se vê, roubavam. Tínhamos clientes que estacionavam ali o carro à porta e, como o senhor Alfredo era tudo para eles, davam-lhe ordem de dormir dentro de um carro e vigiar os pinheiros.

Era costume fazerem-se fiados aos fregueses e houve ainda bastantes problemas. Os fiados maiores ainda não eram naquela gente mais pobre. Eram pessoas que até tinham criada e diziam: “no fim da semana pagamos”. Mas, às vezes, não deixavam dinheiro à criada e... Pronto, havia de tudo. Mas tudo se superou. Tudo mais ou menos corria benzinho.

Agora, por último, acabarmos com a criação, porque o meu marido teve uma alergia à pena do frango. O relatório até foi escrito para o estrangeiro, porque não havia médicos que lhe descobrissem de onde é que vinha a alergia. Depois, foi descoberta no Hospital de Santa Maria pelo doutor Palma Carlos. Tratou-o e foi operado. Hoje o meu marido, se deixar cair os óculos, não vê nada. Mas com os óculos, graças a Deus, ficou a ver muito bem. Então, tivermos que acabar com a criação viva e pusemos um balcão frigorífico. Vendíamos a criação que o nosso fornecedor nos levava de Pernes já arranjada.

Por fim, vendíamos já muito para turismo. O que me deixou mais pena ainda foi o turismo. Tinha havido o 25 de Abril e bem falta me fez. Naquele tempo é que eu gostava de lá estar, porque tínhamos ali dois hotéis mesmo à beira e muito freguês na casa. Tínhamos o Hotel Roma, que foi feito mesmo arrumado a nós, e o Hotel Lutécia e muita gente amiga. Eles não deixavam a minha casa por nada! Nem por as boas casas. Havia o grupo da Varig, do Brasil, que amávamos como família. Eles diziam:

- “A Casa das Botelhas não deixamos por nada!”

Eles compravam os vinhos, compravam as frutas para levar e, então, era umas amizades! Quando os turistas chegavam, diziam logo:

- “Senhor Alfredo, vai fazer um descontozinho e todo o mundo vai comprar aqui!”

Então, iam ao hotel e traziam o grupo. Às vezes vendia ali duas ou três caixas de vinho Mateus Rosé ou de outras marcas.

Mas, enfim, teve que ser. Tivemos que deixar a mercearia e viemos mesmo para o Monte Frio. Fui para Lisboa com 20 anos e voltei com 52. Voltei muito nova, derivado à doença.